Potente, como o ruído ancestral da cidade onde nasceu, São Paulo. Mas sensível e intuitiva como a Mata Atlântica, que tomou conta dessa região antes da metrópole nascer. “ Minha mãe diz que eu sempre fui tinhosa. Na verdade, eu sou movida a desafio. Sempre fui muito inquieta realmente, desde muito pequena”.
Desde muito pequena, Luciana Navarro, ou Lu, como é frequentemente chamada, percebe-se conectada com a natureza, como se já entendesse que dela dependemos, mesmo tendo vindo ao mundo na maior cidade do país. Era uma criança que destoava das demais, fugindo dos produtos industrializados que já lotavam as prateleiras dos supermercados na década de 1980 e se abrigando na segurança dos alimentos naturais e frescos. Até os cuidados com a beleza, busca implacável da adolescência, ganhavam para ela outros sabores. “ Eu passava gelatina no cabelo e todas as minhas amigas me zoavam. Aquilo dava um trabalho! Você fazia, deixava na geladeira no copo fechado. A usabilidade era péssima. Sujava a casa toda, mas isso sempre esteve na minha jornada. Eu acho que o autocuidado e esse olhar para alternativas possíveis e mais naturais”, relembra ela.
Pensar que nasceu daí o sonho e a semente de Care Natural Beauty, a marca de beleza limpa fundada por ela e pela amiga Patrícia Camargo, é reduzir uma jornada a um fragmento da verdade. Lu e Paty caminharam muito para chegar até aí...
No caso de Luciana, os passos pelo mundo do empreendedorismo começaram cedo. Aos 23 anos, logo depois da faculdade de Turismo, ela criou a própria empresa de live marketing com outros sócios. E quem acredita que é preciso dinheiro, experiência, equipe qualificada, escritório em local badalado para iniciar um negócio definitivamente não a conhece. “ Eu comecei na sala da casa dos meus pais e aí a gente foi crescendo, crescendo”. Já estávamos com um escritório grande na Avenida Luiz Carlos Berrini, zona sul da capital paulista, com uma unidade Miami, comprando outras empresas”, conta ela.
Entre o eterno dilema materno de se dividir entre a filha e o trabalho, ela se viu grávida de novo. Mas nem houve tempo para comemorar. Um após o outro, os exames mostravam que não estava tudo bem com aquele outro ser que crescia dentro dela. A ultrassonografia não revelava nada, os hormônios aumentavam rápido demais. De médico em médico, de laboratório em laboratório, ela descobriu viver uma gestação molar. Também conhecida como mola hidatiforme, nesta condição, depois que o óvulo é fecundado, ocorre um erro na reprodução celular e é formado um tumor em vez de um feto. No Ocidente, a cada duas mil gestações, há a ocorrência de um caso. Luciana precisou passar por uma raspagem no útero e, quando acreditou que estava livre do tumor não se livrou da quimioterapia.
O corpo adoecido, quem diria, a levou a ver a beleza como nunca antes havia imaginado. “A beleza, assim na sua potência, até então era um lugar muito muito leve e muito ligado à estética. Não era algo tão profundo para mim. Virou de fato um olhar completamente diferenciado no momento da quimioterapia. Foi o momento em que o autocuidado saiu daquele lugar muito superficial e algumas vezes julgado como fútil para uma ferramenta de força absurda que eu nem sabia que era capaz”.
Não que fosse fácil se manter e se sentir bonita em meio a um turbilhão de medicamentos e procedimentos. As substâncias presentes nos produtos de beleza que prometiam deixá-la ainda mais bonita, na verdade, poderiam tornar feia a situação, agravar o quadro da doença. Era preciso abraçar os produtos naturais. Entre uma quimioterapia e outra ela estudava. Substâncias químicas, absorção no organismo, alterações hormonais causadas por disruptores endócrinos. E quanto mais sabia, mais se assustava. E quanto mais permitia que tratamento curasse seu corpo, via o despertar de questionamentos na alma. “Era muito difícil para mim abrir mão mesmo do eu consegui construir, galgar um lugar no mundo corporativo. Já tinha uma certa estabilidade financeira, um conforto e me perguntava `por que eu não estou feliz?´ Mas não era só isso. É preciso ter algo a mais para brilhar o olho, sabe?! Tem que ter um impacto muito maior do que simplesmente entregar uma linda campanha, executar um belíssimo e grandioso o evento. Para mim vai muito além”.
Em contato com o imponderável da vida, Lu aprendeu sobre si mesma. Precisava se reinventar para que olho brilhasse de volta. A mola hidatiforme se tornou uma mola propulsora, transformou questionamentos em inconformismo. Fez do inconformismo um agente transformador. “ Eu gosto muito de trabalhar e precisei de chacoalhão tão forte para me fazer repensar tudo. Então, eu acredito muito no caminho que o universo traz para a gente. É tudo muito orquestrado”, reflete ela.
Na partitura dessa sinfonia orquestrada estava o encontro com Patrícia Camargo. Advogada do departamento jurídico de uma multinacional de cosméticos, ela seguia também incomodada com os rumos que sua carreira vinha tomando. O desejo de tornar possível o acesso a produtos de beleza limpos para todos e deixar como legado para as futuras gerações um negócio que transmutasse o consumo as uniu. Elas queriam inventar algo que ainda não existia no país com a maior biodiversidade da Terra. E conseguiram...
Do luto traumático de uma gestação interrompida, da fragilidade de um corpo açoitado pela quimioterapia, ela tirou forças pra dar à luz Care Natural Beauty. Ao lado da “sócia linda” Paty, empenhou recursos e esforços para construir para as duas, a partir do nada, uma empresa que reescrevesse a história dos cosméticos no Brasil. “ Aprendemos tudo na escola da vida. A gente foi estudar muito. Sou muito intensa, a sócia linda também é. Então, a gente mergulhou profundamente no universo da beleza limpa. Eu já conhecia muito da potencialidade de ativos naturais e tal. Mas queríamos ir além, ter maquiagens e produtos premium. Viajamos o mundo fazendo conexões para aprendermos onde é o berço, onde está o que há de mais moderno em cosméticos naturais de formulação limpa. Fomos para a Europa. Lá existem fábricas que falam de beleza limpa e produzem há mais de 35 anos. Aqui no Brasil ainda estamos engatinhando. Durante um ano e meio falamos com laboratórios, dermatologistas para entender sobre ativos, mecanismos de ação. Foram aulas e aulas”, relembra Lu.
A partir daí foi a hora de construir o próprio portfólio, com um controle de qualidade rigorosíssimo. “A gente é quem de fato desenvolve todos os produtos. Desde a formulação até a embalagem. Todos os produtos só nascem porque eles são muito queridinhos. Se as nossas amigas não falarem que não dá pra viver sem isso não precisa nascer o produto, porque o mundo não precisa mais de cacarecos”.
Do cuidado de Lu e Paty com cada produto e com o meio ambiente nasceram cosméticos que fazem parte da rotina e da história de muita gente. O Sérum perfeito Skindrops Glow, os lipbalms que hidratam e protegem a pele dos lábios, os duos incríveis que embelezam enquanto tratam. Tudo com embalagens sustentáveis, sem testes em animais, com a neutralização de carbono, através da compensação da emissão de CO2 das entregas dos produtos. Cada batom, cada lápis de olho, cada corretivo carrega em si a alegria contagiosa da generosidade que vai para casa dos consumidores e vem de volta, em forma de elogios e fidelização. O conceito de sustentabilidade se eleva a outro patamar. “Care nasceu da vontade de mudar o mundo, mudar a forma de consumir, de provocar as pessoas a pensarem o que consomem, o que elas financiam quando decidem comprar algo, que processo estão patrocinando. O que elas estão levando pra dentro da casa delas, da família delas? O que estamos consumindo impacta o mundo. É muito estranha essa dissociação entre o problema que o mundo está passando e as atitudes diárias de cada um. Enquanto as pessoas não entenderem que é tudo uma coisa única e que o meu pequeno gesto tem, sim, muito valor e muito impacto a gente não consegue mudar. Então, essa vontade de fazer diferente e ser um convite a repensar o consumo nasce com a Care. Se uma marca de beleza limpa, com ativos de origem natural aliados a alta tecnologia pode me entregar essa performance, será que eu não posso repensar outras coisas, como produtos de limpeza, como minha alimentação?”, acrescenta Luciana.
Ela mesma repensou a vida e os hábitos. A alimentação, que sempre foi saudável, ganhou ainda mais atenção. Se veste de sustentabilidade, escolhendo roupas desenhadas e costuradas no Brasil, por marcas brasileiras e socialmente responsáveis. Escolhe com critério todos os produtos que consome, as batalhas que quer lutar e os sonhos que terá pela frente. “ Meu sonho é ver a Care se perpetuar. É de fato ser referência no Brasil e no mundo em beleza limpa. Levar a beleza brasileira para o planeta todo conhecer. Não estou falando de padrão estético, mas, sim, da capacidade de empreender, de criar soluções. Até porque, o padrão não deveria existir. Padrão é não ter padrão. Padrão deveria ser a gente se conhecer e aprender a se cuidar, a se gostar. O lindo é que ninguém é igual a ninguém.”
Lu não é igual, mesmo. Não se estreita para caber em nenhum padrão estético ou empresarial. Nem permite que sua que existência gloriosa seja adestrada. Ela ousa. Uma mulher que teve a coragem de enfrentar as barreiras do corpo e da sociedade, valentia para tentar fazer diferente, produzir diferente, criando não só uma marca ou uma linha de produtos, mas também um mundo mais limpo e sustentável para todos. Uma mulher intensa, um furacão, que governa a própria vida acumulando papéis de filha, de mãe, de sócia, de amiga, de empresária, do individual para o coletivo, do corporativo para o social. Permitiu-se ser cuidada quando precisou, para depois cuidar dos outros e do planeta. Não é à toa que sua "filha" mais nova se chama Care.
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