A construção da usina de Belo Monte é uma tragédia sem tamanho, a usina que paralisou as águas do rio Xingu, no meio da Amazônia, prometeu oferecer energia limpa para um país. Mas entrega apenas 50% do prometido porque a vazão do rio nunca foi capaz de movimentar as turbinas. Nenhuma novidade: pesquisadores já haviam anunciado isso antes da obra que levou 30 mil pessoas a cidade de Altamira, no Pará, alterando para sempre o curso da vida na região.
Os cientistas avisaram: além de não produzir energia suficiente a usina seria responsável pela extinção de espécies que só existem ali e em nenhum outro lugar do mundo. Mesmo assim, nada foi feito.
O que ninguém imaginava era o tamanho do estrago que a obra causaria na vida de milhares de ribeirinhos e indígenas conectados ao rio, que sobreviviam graças ao rio e à floresta. Gente que tinha tudo, graus à natureza. Gente que foi obrigada a abandonar suas casas, cultura e modo de vida para ser convertida em miserável na cidade.
Essa história de devastação e morte está em "Terror e resistência no Xingu”. A obra é resultado da tese de doutorado em Antropologia Social na Unicamp, da antropóloga Ana De Francesco, sob orientação do professor Mauro Almeida, entre os anos de 2013 e 2020.
O livro, lindo, bem escrito e ilustrado, começa com uma narrativa sobre a história de ocupação não indígena do médio curso do rio Xingu, ao descrever a constituição histórica do beiradão a partir das tensões e conflitos que lhes são constituintes.
Traz às claras a violência da ruptura social e ecológica provocada pela instalação da UHE de Belo Monte e seus efeitos devastadores na vida das comunidades locais, especialmente os ribeirinhos expulsos de suas casas, do rio, dos igarapés e dos baixões de Altamira. O resultado deste processo é a desfiguração do mundo, que gerou, nas palavras da autora, um deslocamento ontológico, quando toda a ordem e sentido das coisas são alterados, fazendo com que tudo aquilo que é tido como certo, deixa de acontecer, causando desorientação, rupturas e adoecimento.
“A gente é igual um braseiro: se a gente tira uma brasa e põe num canto ele apaga; mas se ficam juntas elas permanecem acesas”.
Também estão lá as respostas colocadas em movimento para fazer frente ao cenário de destruição provocado pela implantação da usina. Nasceram dessa catástrofe movimentos, conselhos, laços inquebrantáveis de resistência. A atuação do Ministério Público Federal e da comunidade científica, bem como as respostas do governo federal e da Norte Energia, empresa concessionária da usina também estão registradas pela autora. O que não se corrige, não se apaga é a dor que cada vítima de Belo Monte carrega no peito. Quem teve que deixar sua casa e sua roa, quem perdeu um ente querido devido à violência que assola a cidade após a instalação do empreendimento. Belo Monte continua fazendo vítimas: na floresta e fora dela. Leia "Terror e resistência no Xingu”, não deixe essa história de terror ser esquecida.
TÍTULO: "Terror e resistência no Xingu”
AUTORA: Ana Alves de Francesco
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